Lucianne Carneiro – O GLOBO
Um dos destaques da economia brasileira nos últimos anos, a emergente classe C agora alça novos voos. O Brasil já vive, segundo especialistas, um processo de migração de parte da classe C para a B. Estudo da Ativa Corretora estima que 5,9 milhões de pessoas devem avançar para a classe B até o fim de 2011, na comparação
com o início de 2009. Com isso, o grupo — com renda familiar entre R$ 4.807 e R$ 10.375, segundo o levantamento — deve chegar a 15,4% da população brasileira, ou 29,363 milhões de pessoas. O documento mostra ainda que, com a melhoria da renda média na classe B, o perfil de consumo tende a se refinar, e ganham espaço gastos como educação, alimentação fora de casa, transporte, higiene e assistência à saúde.
— Nossa estimativa é que, além dos seis milhões que deixarão a classe C em direção à B, três milhões sairão da D para a C. Isso é fruto do forte crescimento econômico do Brasil nos últimos anos e do aumento do trabalho formal e do crédito — afirma o economista-chefe da Ativa Corretora, Arthur Carvalho Filho, um dos autores do estudo.
— Há uma migração positiva das classes sociais brasileiras, e muitos que eram da C estão indo para a B — concorda o diretor da consultoria IPC Marketing, Marcos Pazzini.
Classes A e B crescem em maior velocidade
● O diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, Marcelo Neri, diz que seus estudos vêm mostrando essa ascensão da classe C à B. Segundo ele, apesar de a C ser a maior do país, em números absolutos, são as classes A e B que crescem em ritmo mais expressivo. — No acumulado dos 12 meses até julho, o crescimento da classe AB foi de 13%. É a que proporcionalmente cresce mais — diz Neri.
Mais do que revelar a tendência de migração da classe C para a B, o estudo da Ativa Corretora aponta ainda um maior refinamento do consumo. Os gastos com educação
avançam, como forma de garantir o futuro da família e a manutenção do padrão de vida. Outra despesa que avança é com transportes, já que os carros próprios exigem os gastos com combustíveis.
— Os dados mostram que o padrão de consumo da classe C de hoje é maior que o da B de 15 anos atrás — diz Arthur Carvalho Filho.
A educação dos dois filhos é uma das principais preocupações da dona de casa Valeria Cristina Rodrigues Carvalho Martins, de São Paulo, e de seu marido, Juramir Paulo Martins. Hoje na classe B, a família, cuja renda mensal fica em torno de R$ 7 mil, reserva cerca de 20% do orçamento para pagar a escola particular para Vinicius, de 14
anos, e Barbara, de 10. Mas também há espaço para alimentação fora de casa, lazer, viagens e higiene e cuidados pessoais. Eles vivem numa casa construída ao longo
de cinco anos, enquanto moravam na casa da mãe de Juramir. — Aqui não se come em casa sábado e domingo. Ou tem convite para festa ou vamos ao restaurante — conta Valeria, que também faz visitas semanais ao salão de beleza.
Na família do advogado Daniel Lazary, sócio franqueado de uma loja da rede MegaMatte no Rio, o lazer também surge como despesa importante do orçamento (cerca de 30%), além dos recursos destinados a garantir o futuro para o filho de três anos. — Em 2011, nossos gastos com educação devem aumentar, já que queremos colocar nosso filho em aulas de inglês, música e natação. E ele tem um plano de previdência desde que nasceu — diz.
Mas o sócio-diretor do Instituto Data Popular, Renato Meirelles, defende que os valores não necessariamente mudam com a melhoria da renda da população e a ascensão a uma nova classe social. — Existe uma classe C emergente, que está melhorando de renda e avançando para a B. Mas querer ser rico não é querer ser como rico. Existe uma busca por qualidade, por exemplo, mas não por marcas — aponta.
Para o sociólogo e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Rafael Guerreiro Osorio, o que existe hoje no Brasil não é uma migração de classes sociais, mas sim de extrato de renda. — Houve crescimento real da renda das famílias, a desigualdade caiu, e as pessoas estão melhorando de vida e se movendo. Mas não significa que haja mobilidade social entre as classes — afirma.
Novos anseios por educação e trabalho
● O sociólogo explica que o conceito de classe social está ligado à posse de propriedade privada, à posição na divisão do trabalho e ao exercício de poder nas relações de trabalho. — A nova classe média tem demanda por educação e anseios trabalhistas. São variáveis que estão andando mais rapidamente que o consumo, não são meramente classes consumistas — diz Marcelo Neri. Ele considera muito otimista o cálculo de seis milhões de novos participantes da classe B até o fim de 2011 do estudo da Ativa Corretora. Sua estimativa é que as classes A e B ganhem, juntas, 6,5 milhões de novos integrantes até 2014. Este foi o crescimento registrado
entre 2003 e 2009.
Para efeito de simplificação, o levantamento considerou uma taxa de crescimento da renda real igual entre as diferentes classes. Além disso, aponta Carvalho Filho, a inflação estimada no relatório é de 5,2% em 2011, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Mas, se a alta do custo de vida ultrapassar esse nível,
pode comprometer a renda da população e afetar a estimativa. Para segurar a inflação, na última sexta-feira o Banco Central (BC) anunciou medidas de restrição ao crédito, cuja forte expansão nos últimos anos puxou o crescimento da classe C. Analistas dizem que o BC pode elevar os juros básicos da economia em janeiro, com o
mesmo objetivo: conter o consumo. ■
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